terça-feira, 23 de agosto de 2011

FAXINEIRA DE ILUSÕES E O PROUSTIANO MUNDO PERDIDO DE SUAS RECORDAÇÕES.


A Faxineira de Ilusões parou na praça para descansar e reencontrar emoções, lembrando que está pertinho de sua cidade fazer aniversário...
Mas, festejar é ato sério, requer veracidade de reconhecer a data como algo importante de ser aplaudido.
E , dentro da alma, buscou o passado, precisando fazer comparações...
E buscou,buscou, buscou...
Por onde anda aquela paisagem que foi sua companheira há tantos anos atrás? Em que beco se esconderam as pessoas que ali transitavam e davam um colorido especial à cidade?
Cadê a marca da infância que se formou ali, dos gritos infantis,que brincou de roda, de se esconder com os marmóreos leões e tinha a pureza de bater palmas para a imensa árvore, que dava limite ao histórico bar e à casa de Deus e foi derrubada?
Cadê a menina pequenina que gostava de passear ali, que sorria muito, tinha vestido pregueado, laço de fita nos longos cabelos e acreditava que todos eram iguais ao seu mundo?
Em que instante lhe avisaram que há paradas, como as brincadeiras de “mandrake” paralisando seus sentimentos?

Cadê a história de sua cidade?
Cadê a memória dela?

Em que gaveta estão guardados os manuscritos, as fotografias, os contares de quem amou tudo isso e não é mais lembrado?
Em que casa estão abrigadas as imagens de tantos momentos especiais à cidade, que a dimensionaram, dando-lhe o título nobre de princesa?
Por que tanta amnésia pelos grandes feitos e pelas idéias que, brilhantes, fizeram dos construtores da cidade, benfeitores de luz?

A Faxineira buscou, buscou, buscou...
Queria a essência de tudo que teve, porque sempre acreditou na evolução, em crescimento,mas, queria o eterno.
Queria a essência, a memória, a história!

Olhou para os lados e sentiu saudade de tantas saudades, de tantos quereres que se foram e , agora,descansam em mundos, que não podem ser vistos...
E andou, andou e parou em outro espaço que fincava mais recordações.
Cadê a casa que limitava a esquina da praça dos pinheiros? Cadê a sua imagem em papel, que eterniza a sua existência, pois deu lugar a outra construção?Cadê a praça e a sua história homenageando o homem que acreditou nos moços e escreveu sua oração?

Ela só queria a história, a memória!

Cadê os bancos que faziam companhia à tímida,mas, tão rica avenida, palco de tantas risadas, de tantos seres em plena juventude, com sonhos ainda adormecidos e, muitos, hoje concretizados ?
Cadê a lembrança da história de homens que, leões, criaram clubes de serviços em prol da carência e a favor da solidariedade?
Por que não se fala mais em tantos nomes, em pessoas especiais que chegaram aqui para construir e não apenas usufruir?
Por que não dizer às crianças sobre os homens daqui e os que aqui chegaram e tanto fizeram e que deixaram continuidade em seus ideais?
A Faxineira queria limpar as traições,os esquecimentos, os responsáveis pelos monumentos derrubados, os tesouros da cidade roubados...
Queria polir para ficar mais em evidência muitos exemplos...
E lembra do nobre gaúcho, lá dos pampas, que, aqui, ensinou tantas coisas, tinha sensibilidade e acalentava a doce poesia na alma ,e, hoje (pelo menos isso!) é nome de escola em bairro periférico. E vem junto um outro companheiro, que é nome de rua em seu bairro do coração.
Quem vai contar suas histórias para serem ouvidas?
Quem lembra de ações voltadas para a educação de um casal do passado, dos sacrifícios de sua família em nome do amor pela comunidade, pela vontade de abrir os caminhos do aprendizado para quem precisava trabalhar, oferecendo a sua própria casa?
Por que não contar suas historias e de tantos outros, reservas morais que tinham olhares especiais?

Faxinando os pensamentos, ela permaneceu em eterna busca...
Queria memória, queria história!

Em que caverna estão escondidos os adormecidos e hipnotizados seres que ela buscava para construir isso?
Queria a essência, a memória, a história! E sente pela terra, que está pertinho de comemorar data bonita...

Vai varrendo tanta sujeira, recolhendo tanto lixo e percorre as ruas, com o máximo cuidado para não sofrer acidentes... e, no calçadão, abraça a saudade daquela nobre mulher,Rosa lady , herdeira da terra de Davi, o longínquo e sofrido berço de seus antepassados, que mudou a visão feminina, arregaçando as mangas e provando que feminilidade pode ser traduzida em trabalho além do âmbito familiar e que combina com cultura, unindo olhar e vanguarda e ânsia de preservar a memória de seu amado.
Quantas saudades, quantas pessoas fazendo falta à Faxineira de Ilusões, que observa,de longe, o que fizeram com suas vivências!

Ela só queria memória e história, que chamam gratidão, lembram construções, eternizam contares e imortalizam grandes ações!
Ana Virgínia Santiago
Texto de 15/06/2007 .

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