segunda-feira, 5 de outubro de 2009


A MANHÃ DE SOL E A MORTE DA BORBOLETA
(Devaneios da Faxineira de Ilusões)
( foto de Rhett A. Butler)

Aqui estou, essência que sou eu e ainda se chama vida, madrugando como a manhã de domingo que já chegou com a sua jornada extasiando a quem ainda respira e sobrevive aos combates interiores que acontecem independente da vontade, pois chegam enluarados, enganam a alma fazendo-a uma só paixão...
Aqui tudo é silêncio. Como silenciosa está a minh’alma que se protege dos turbilhões para não mais acordar um atônito ser que um dia acreditou em tantas coisas e sequer se viu por pura ilusão.
Mas, a madrugada chega dizendo de luz! O céu agonia de tão bonito e manda-me pitadas de estrelas em plena manhã que se iniciará como se dissesse que a esperança não é só aquele pequenino animal, frágil e belo- uma esperança – que numa noite pousou em meu teclado.Pode ser um sentimento revirado pelo avesso, para não ser mais estúpido e inconseqüente.
Os recados vão chegando: raios de sol que invadem o espaço criador inebriam os olhos de quem não tem mais nada para espreitar e constroem minúsculos pontos- réstias iluminadas- que me cegam para a beleza de uma manhã tão bonita, meus outros eus (pessoanos?) que tentam empurrar a melancolia para longe, porém, fragilizados, não podem ir adiante; migalhas de amor em forma de amizade duradoura e que me diz estar viva; presença dos meus cantantes que festejam o ensolarado domingo.
Todos recados chegando até mim...

Um fato inusitado , porém, vem contestar a beleza desta manhã: uma borboleta pequenina entrou por minha janela, acomodou-se na parede branca, destacando-se por ter o vermelho e o negro como domínios de sua existência.E, como num tango de Piazzolla, ela dança tragicamente, esvaindo-se em movimentos silenciosos, dolorosos, sofridos, observados apenas pela espectadora que se espelha em sua dança de extermínio.
Lutar...Tentar...Desistir...Lutar mais uma vez.
Enalteço a vida que já se finda diante de mim, asas fazendo movimentos quietos, lentos, lutados, por uma improvável sobrevivência e recordo outras bailarinas, mulheres que morreram lentamente, alçando vôos inimagináveis em sua arte e sucumbiram de amor, tristeza e paixão.
Eu-espectadora absorvo o sofrimento do pequenino ser negro e rubro que traduz a angústia de não mais ter tempo para viver e me pergunto: por que escolheu o meu espaço para perecer?
De que céus terá vindo e o que aconteceu para que aquela trágica e alada bailarina fizesse os seus últimos gestos diante de mim que me vejo em seu contorcido esforço para continuar voando?

Uma borboleta rubro-negra chegou em minha janela contrastando com o sol, como uma lição de vida.
Lutar...Tentar...Persistir...Descansar.
Uma borboleta que desistiu de ser guerreira executando o seu vôo derradeiro numa lenta queda de asas negras, manchadas de vermelho...
Eu-espectadora, silenciosa como a minh’alma (mesmo que salpicada de estrelas em pleno dia amanhecendo), observo a pequenina bailarina cair, cair, cair e, solenemente, adormecer em paz. Enfim!
E, reverenciando aquele momento, acolho a pequenina borboleta, com as mãos em concha e guardo,numa caixinha de música, como um amuleto, a bailarina que entrou por minha janela, acomodou-se na parede branca, e, como num tango de Piazzolla, dançou tragicamente, esvaindo-se em movimentos silenciosos, dolorosos, sofridos, para eternizar o seu sono.

Nenhum comentário: