terça-feira, 17 de março de 2009

Mulheres que correm com os lobos (Clarissa Pinkola Estés )

MULHERES

Passei por duas experiências decisivas quando estava com vinte e poucos anos,experiências que contrariavam tudo que me haviam ensinado sobre o corpo até então.Quando estava num seminário de uma semana de duração para mulheres , á noite junto ao fogo e perto de fontes terminais, vi uma mulher nua com cerca de 35 anos.Seus seios estavam murchos de amamentar;seu ventre estriado de dar a luz. .Eu era muito nova e me lembro de ter sentido pena das agressões pela sua pele fina e clara.Alguém estava tocando tambores e maracas, e ela começou a dançar, com o cabelo, os seios, a pele, os membros todos se movimentando em direções diferentes.Como era linda, como era cheia de vida.Sua graça era de partir o coração.Eu sempre havia ridicularizado a expressão "furacão nos quadris".Naquela noite, porém vi um exemplo.Vi o poder das suas ancas.Presenciei o que me haviam ensinado a ignorar;o poder do corpo de uma mulher quando é animado de dentro pra fora.Quase três décadas mais tarde, ainda posso vê-la dançando no escuro e ainda sinto o impacto da força do corpo.
O segundo despertar envolveu muito mais velha. De acordo com padrões vigentes, seus quadris eram excessivamente parecidos com pêras,seus seios eram ínfimos em comparação,e suas coxas eram totalmente cobertas por finíssimas veias arroxeadas.uma longa cicatriz de alguma cirurgia grave circundava seu corpo,indo desde a coluna vertebral até as costelas, como um corte pra descascar maçãs. Sua cintura devia ter a largura de quatro palmos.
Era, portanto, um mistério o motivo pelo o qual os homens zumbiam a sua volta como se ela fosse um favo de mel. Eles queriam morder suas coxas de pêra, lamber aquela cicatriz, segurar aquele peito,descansar o rosto nas teias da suas
varizes. Seu sorriso era deslumbrante;seu caminhar, extremamente belo.E quando ela olhava, seus olhos realmente absorviam o que estavam vendo. Vi novamente o que me haviam ensinado a ignorar, o poder no corpo.O poder cultural do corpo é a sua beleza, mas o poder no corpo é raro, pois a maioria das mulheres o expulsou com torturas ou com sua vergonha da própria carne.
Tendo em vista o exposto, a mulher selvagem pode pesquisar a luminosidade do próprio corpo e compreendê-lo, não como um peso morto que estamos condenados a carregar por toda vida, não como uma besta de carne, mimada ou não,que nos carrega por aí pela vida inteira,mas como uma série de portas, sonhos e poemas através dos quais podemos obter todo tipo de aprendizagem e conhecimento.Na psique selvagem,compreende-se o corpo como um ser por seus próprios méritos, que nos ama, que depende de nós, para quem, de vez em quando, somos a mãe e que, de vez em quando, representa a mãe para nós.

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